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terça-feira, 21 de novembro de 2017

Atraso em repasse de leite preocupa pais e gera protesto

A viagem da dona de casa Maria Neci, 36, com Maria Clara, 1, no colo teve uma chegada frustrada. Após quase três horas de estrada de Icapuí, a cerca de 202 km da Capital, para receber a fórmula alimentar da filha, alérgica à proteína do leite de vaca (APLV), soube que a distribuição do insumo atrasaria, sem previsão de normalizar. Assim como ela, dezenas de mães e familiares se reuniram, na manhã de ontem (20), em frente à sede da Secretaria da Saúde do Estado (Sesa), para reivindicar o fim da espera pelo leite especial, base alimentar de crianças com restrições alimentares.

Segundo a presidente da Associação das Famílias e Amigos de Crianças com Alergia Alimentar (Afac), Aline Saraiva, o repasse do produto está atrasado há um mês, período em que, conforme contabiliza, cerca de 5 mil crianças estão sem abastecimento da fórmula alimentar. "É uma questão de vida ou morte porque a ausência desse leite pode provocar desnutrição, complicações gastrointestinais e até infecções respiratórias. E uma fórmula dessa para uma família que vive com um salário mínimo é impossível de custear", diz, estimando o valor de uma lata de 400g das fórmulas Neocate LCP e Aptamil Pepti, indicadas para crianças de 0 a 3 anos, e Neocate Advance, para crianças de 3 a 10 anos, entre R$ 120 e R$ 300.
A administradora Camila Garcia, 42, tentou driblar as limitações financeiras e recorreu a um empréstimo bancário para comprar as 32 latas mensais do leite especial - totalizando, segundo ela, um montante de R$ 5.600 - para os gêmeos Enzo e Levi, de oito meses, cuja alimentação depende exclusivamente da fórmula. "Eu cheguei a diluir o leite deles para conseguir doar uma lata à mãe de um bebê de dois meses, que não tinha como comprar", declara.
As consequências da falta do insumo também foram vivenciadas por Enzo Gabriel, de um ano e sete meses, alérgico à proteína do leite de vaca. "Ele foi fazer o TPO (Teste de Provocação Oral, que identifica o nível da intolerância e detecta possíveis melhoras) para a transição da fórmula para o leite normal, e começou a ter crises. Quase teve uma parada respiratória e ficou 12 dias internado", relata a mãe, Gabriela Oliveira, 29, que recebe mensalmente oito latas da fórmula especial Pregomin, uma das quatro distribuídas pela Sesa. "Como ele ficou no hospital, sobrou um pouco de leite. Estou me virando, desdobrando, porque não tenho condições de comprar", completa.
Ação
Diante do atraso no recebimento, a Defensoria Pública do Ceará entrou com uma ação civil pública com caráter de urgência "para que o Estado fornecesse imediatamente" o alimento especial. De acordo com o defensor público responsável pela ação, Eliton Meneses, um prazo de três dias, contados a partir da notificação da Sesa, foi determinado para a regularização do repasse. A multa diária em caso de descumprimento da determinação judicial é de R$ 500, "mas nosso principal objetivo é que as crianças recebam logo as fórmulas, porque diz respeito à vida delas", afirma Meneses.
Atualmente, de acordo com a Secretaria da Saúde do Ceará, 3.384 crianças estão cadastradas no Programa de Alergia à Proteína do Leite de Vaca (APLV) - instituído em 2015 - em todo o Estado, das quais 2.500 recebem um dos tipos de leite especial regularmente no Centro de Saúde Meireles (CSM), no Hospital Infantil Albert Sabin (Hias) e no Núcleo de Atendimento Médico Integrado (Nami). Além da distribuição gratuita das fórmulas alimentares, o programa oferece atendimento médico e nutricional às crianças com alergias a alimentos na Capital, já que, segundo o titular da Sesa, Henrique Javi, "não existem equipes capacitadas no Interior" para tratar desse público, que precisa viajar à Fortaleza para receber o insumo.
Ainda na manhã de ontem, o secretário recebeu um grupo de mães beneficiárias do Programa APLV para justificar a falta de repasse dos produtos neste mês. "O atraso não é de um mês, mas de, no máximo, 15 dias, e aconteceu exclusivamente por questões burocráticas que não são previsíveis", declarou Javi, afirmando, ainda, que tais questões geram atrasos na obtenção de outros diversos insumos essenciais à Saúde. Quanto aos leites especiais, o titular da Pasta garantiu que "todas as fórmulas serão entregues até o fim desta semana".
Sobre a fórmula Neocate Advance, receitada exclusivamente por profissionais de Nutrição de acordo com a necessidade de cada criança, a Sesa afirmou que não existe uma idade-limite para seu recebimento. Contudo, a idade máxima ideal para entrada no Programa APLV, afirma a Pasta, é de até três anos.
Segundo a Defensoria Estadual, cerca de 70 novas reivindicações chegam diariamente ao Núcleo de Defesa da Saúde (Nudesa), somando denúncias ao serviço público e a planos de saúde. Para Eliton Meneses, o cenário reflete um problema crescente. "As ações mais comuns são da judicialização da saúde, pessoas que procuraram cirurgias, medicamentos ou tratamentos na saúde pública e tiveram acesso negado. O SUS (Sistema Único de Saúde) não tem conseguido dar vazão à demanda e a saúde não tem sido encarada com prioridade", analisa o defensor.
Protagonista
Redução no repasse também causa receio
Não só o atraso no repasse da fórmula Neocate Advance, da qual a pequena Ana Alice, 3, precisa para compor a alimentação, tem preocupado Aline Braga, 31, mãe dela. Segundo diz, a quantidade de latas recebidas pela criança - alérgica não só à proteína do leite de vaca, como também a trigo, soja, maracujá e uva - foi diminuída de oito para seis. "Fui informada de que quando ela completar 4 anos deve sair do programa, e ela nem curada tá ainda", preocupa-se

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